Deu ruim para a crônica que, aqui, habitaria

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Telmo | São Joaquim de Bicas MG
Mas compenso sua inexistência citando Drummond

Ia fazer das linhas a seguir um outdoor para minhas reclamações amorosas. Ia usar todo esse espaço para berrar, aos quatro cantos das margens, minhas insatisfações e desilusões a respeito da relação carnal-sentimental, vulga: amor.

Nessas laudas, queria promover uma verdadeira baixaria. Talvez eu começasse hesitando, com cautela, mas, aos poucos, eu pretendia me entregar ao sentimento de revolta e indignação que me ocupava há pouco.

Começaria dizendo que o amor é coisa da Disney, e que não sei o que ela ganha com isso, além, claro, de um bando de crianças iludidas e futuros jovens frustrados. Seguiria falando que amor é coisa de música dos Beatles; livros infanto-juvenis; filmes da Sessão da Tarde, aquelas comédias românticas que fazem tudo parecer bonito, pois são produzidas por roteiristas e diretores fracassados sentimentalmente que veem na arte a possibilidade de realizar suas expectativas; que achava que o amor é coisa rara demais e é por isso que só pertencia ao bonitão da escola, o “playboy-do-cabelo-de-franjinha-bom-de-papo-cheio-de-amigos-e-descolado-que-joga-futebol-e-consome-álcool-ilegalmente”, com sorte também pode pertencer ao melhor amigo dele: o “meio-feio-pegador-de-sobras”; ou, também, coisa daquele primo bem sucedido que não faz nada de mais, mas parece ter sido acolhido pelos deuses do amor (e do emprego, da faculdade...); E até coisa para o vizinho e afins... afirmaria que não é coisa para mim ou para ti (para ti, talvez, quem sabe não estou conversando com o tal bonitão da escola...?).

Esse é o momento em que a crônica se desfaz... O amor chegou pra mim. Há dias, só parecia ter chegado. Há horas, constatei que chegou. E eu me encontro aqui, no meu quarto e nessas linhas, lembrando como foi/é bom beijar e tocar alguém com sentimento, saudosista que só eu, todo bobo e um tanto ridículo, nada ranzinza, entre soluços, amando, vendo o mundo ser ressignificado por alguém.

A minha vida se tornou uma comédia romântica, tudo é bonito! Eu me pergunto se sou resquícios do amigo “meio-feio...”, já que o bonitão eu não sou, mas posso ser o primo ou o vizinho... uma criança iludida ouvindo uma música dos Beatles: Tudo junto...!

Quando o amor bate na aorta (Ah, Drummond!), tira, sim, os óculos dos homens; suspende mesmo as saias das mulheres; e a cócega que o amor faz acontece de maneiras diferentes. Ela existe, também, quando os dentes mordem e os braços prendem, quando se vê beijos que se beijam, se ouve mãos que se conversam... Só tenho medo da sua previsão/profecia, torço para que não chegue no momento em que ele se estrepa, em que ele perde sangue, fica irritado; no instante da ferida que, em mim, não sararia nunca... compreendo que não comentou isso por maldade, caro Carlinhos Drummond, só observou o risco, e, com isso, me causou mais cócegas, um aperto no peito e fez a saudade de quem amo aumentar.

Asseguro, um tanto zonzo desse enlace, para ti, leitor, e para Drummond, que nunca estive tão feliz enquanto constipado.

Peço que tenha fé, leitor, o amor está por ai. Aguente só mais um pouco de decepções, reclamações e sofrimento que ele baterá a sua porta, você abrirá e ele te tocará à aorta, assim como me fez... Te desmanchará uma crônica, dando lugar a outra, te desmanchará inteiro.

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