C036
José da Silva | Vitória de Santo Antão PE
Os meios de comunicação estão dando noticias sobre o Censo 2010. Participar dessa pesquisa do IBGE é uma experiência única. Uma convivência com os vários tipos que compõem a população brasileira. Os ricos, os médios, os pobres, os muito pobres, enfim, os que estão abaixo da linha da pobreza, na chamada “miséria absoluta”.
Eu , algum tempo atrás, fiz esse trabalho, que às vezes é complicado, árduo; às vezes, divertido, interessante, nunca monótono. A princípio, eu pesquisei um bairro da classe média alta, onde as madames, pelo interfone, avisavam aos funcionários que o recenseador poderia adentrar a sua residência e as informações seriam passadas, lá dentro da casa. A questão, suponho: quantos anos a senhora tem?
E eu fazia um percurso, entre um jardim bem cuidado e uma piscina com a água de um azul que era um convite a mergulhar no céu da terra. Uma mulher. Bela mulher. Vestida como se acabasse de sair da cama, fornecia as informações. Após, a execução do trabalho naquela região dos privilegiados, eu fui fazer a coleta em uma favela.
Contrastes violentos. Esgotos, sujeiras, gente sem educação – sem informação. Tudo muito triste. Poderia ser o retrato do inferno no planeta que habitamos. E cheguei em um barraco. Nunca, nunca mesmo, eu havia visto, uma pessoa tão pobre como aquele senhor. Estava ele, sem camisa. Barba grande, branca. Recebeu-me bem. Pediu-me que eu entrasse em sua casa. Eu concluí que ele achava que era uma visita ilustre.
Na casa ou barraco, não havia nenhum móvel, a não ser uma boléia de caminhão improvisada como poltrona. Uma mesa, que na verdade parecia um tronco de árvore com uma tábua em cima. Uma garrafa de café sobre ela. O fogão eram dois tijolos. Mas algo chamou-me a atenção: uma placa na porta de entrada, escrita com letras mal feitas, dizia: “Dinheiro não trás felicidade”. Isso mesmo. Trás, com “s”, quando deveria ser escrito com “z”. Ele, muito gentil, disse que sua profissão era catar papelão, ferro velho, coisas similares.
Ofereceu-me café. Eu aceitei. Ele pegou duas xícaras pequenas que estavam dentro de uma caixa (de papelão). Passou água, e bebemos o café. Eu preenchendo o questionário, os seus dados pessoais e ele comentava a sua vida. Falava dos seus parentes como se todos estivessem ali, ouvindo a nossa conversa. Descrevia a personalidade de cada um. Encontrando uma qualidade em uma determinada pessoa, às vezes enorme, parecia inverossímil; ás vezes, em outra, mínima, perceptível apenas àqueles que exergam pelo coração. Elogiava os que estavam vivos, os que estavam mortos. Todas aquelas criaturas tinham importância na vida daquele pobre homem. Não reclamava daquela situação que ele atravessava com uma resignação sábia. E a placa? Eu com uma enorme vontade de falar do erro ortográfico que ele havia cometido: o “s” no lugar do “z”. Seria exibicionismo meu, pensei.
E conversávamos. Terminei o questionário, e já saindo, quando criei coragem, e lhe disse que aquela frase estava escrita errada. O certo era” z” e não “s”. O homem pegou um saco cheio de lata de tinta e um pincel, e com a tinta branca apagou o s e com a tinta preta escreveu um z. Agradeceu-me. Elogiou os meus conhecimentos. Disse que não teve oportunidade de estudar. E apertamos as mãos e ele desejou-me felicidade. Eu também lhe desejei felicidade.
Eu , algum tempo atrás, fiz esse trabalho, que às vezes é complicado, árduo; às vezes, divertido, interessante, nunca monótono. A princípio, eu pesquisei um bairro da classe média alta, onde as madames, pelo interfone, avisavam aos funcionários que o recenseador poderia adentrar a sua residência e as informações seriam passadas, lá dentro da casa. A questão, suponho: quantos anos a senhora tem?
E eu fazia um percurso, entre um jardim bem cuidado e uma piscina com a água de um azul que era um convite a mergulhar no céu da terra. Uma mulher. Bela mulher. Vestida como se acabasse de sair da cama, fornecia as informações. Após, a execução do trabalho naquela região dos privilegiados, eu fui fazer a coleta em uma favela.
Contrastes violentos. Esgotos, sujeiras, gente sem educação – sem informação. Tudo muito triste. Poderia ser o retrato do inferno no planeta que habitamos. E cheguei em um barraco. Nunca, nunca mesmo, eu havia visto, uma pessoa tão pobre como aquele senhor. Estava ele, sem camisa. Barba grande, branca. Recebeu-me bem. Pediu-me que eu entrasse em sua casa. Eu concluí que ele achava que era uma visita ilustre.
Na casa ou barraco, não havia nenhum móvel, a não ser uma boléia de caminhão improvisada como poltrona. Uma mesa, que na verdade parecia um tronco de árvore com uma tábua em cima. Uma garrafa de café sobre ela. O fogão eram dois tijolos. Mas algo chamou-me a atenção: uma placa na porta de entrada, escrita com letras mal feitas, dizia: “Dinheiro não trás felicidade”. Isso mesmo. Trás, com “s”, quando deveria ser escrito com “z”. Ele, muito gentil, disse que sua profissão era catar papelão, ferro velho, coisas similares.
Ofereceu-me café. Eu aceitei. Ele pegou duas xícaras pequenas que estavam dentro de uma caixa (de papelão). Passou água, e bebemos o café. Eu preenchendo o questionário, os seus dados pessoais e ele comentava a sua vida. Falava dos seus parentes como se todos estivessem ali, ouvindo a nossa conversa. Descrevia a personalidade de cada um. Encontrando uma qualidade em uma determinada pessoa, às vezes enorme, parecia inverossímil; ás vezes, em outra, mínima, perceptível apenas àqueles que exergam pelo coração. Elogiava os que estavam vivos, os que estavam mortos. Todas aquelas criaturas tinham importância na vida daquele pobre homem. Não reclamava daquela situação que ele atravessava com uma resignação sábia. E a placa? Eu com uma enorme vontade de falar do erro ortográfico que ele havia cometido: o “s” no lugar do “z”. Seria exibicionismo meu, pensei.
E conversávamos. Terminei o questionário, e já saindo, quando criei coragem, e lhe disse que aquela frase estava escrita errada. O certo era” z” e não “s”. O homem pegou um saco cheio de lata de tinta e um pincel, e com a tinta branca apagou o s e com a tinta preta escreveu um z. Agradeceu-me. Elogiou os meus conhecimentos. Disse que não teve oportunidade de estudar. E apertamos as mãos e ele desejou-me felicidade. Eu também lhe desejei felicidade.